A transmissão oral é poderosa. O que podemos aprender com a experiência alheia?
Depoimento de Erica Bruno (37 anos, advogada):
Com 13 anos, comecei a fazer aula de dança na academia. Eu estava um pouco acima do peso, uns seis ou sete quilos e fazia aula de duas a três vezes por semana. Eu comecei a fazer dieta com uma nutricionista e me envolvi com um estilo de dança que estava muito na moda aquela época. Era uma mistura de jazz com aeróbica, bastante intensa e dinâmica.
Fazíamos apresentações em ginásios e demonstrações no interior. Porém, depois de seis meses, tive que parar porque tive uma inflamação no joelho. Fui em médicos e comecei a fazer sessões de fisioterapia, mas nunca mais o meu joelho voltou ao normal. Vira e mexe, até hoje, mais de 25 anos depois, eu tenho que voltar a fazer sessões de fisioterapia quando sinto novamente dores no local, além de ter de tomar anti-inflamatórios.
Depois de muito tempo, há dois anos resolvi voltar para a academia e, em vez de fazer aulas em grupos de aeróbica ou outras atividades, decidi fazer musculação para fortalecimento. Na primeira semana, incrivelmente, peguei mais peso do que deveria. Fui para casa, tomei banho e simplesmente travei de uma forma muito intensa. Eu tinha falado para o professor que estava há muito tempo parada e achava que a carga que ele estava colocando estava um pouco pesada. Ele, porém, só ficava me estimulando a aumentar o peso. Ele me disse que era assim mesmo, que, se não estimulamos o músculo com uma carga maior, nós não vamos ter efeito do treinamento no corpo.
Lembro-me de que, quando cheguei em casa, me deu um arrepio da coluna até a cabeça e eu não conseguia mais me movimentar. A coluna travou! Fui até a minha cama e, depois de tentar respirar com calma durante um longo período, eu consegui, finalmente, me deitar. Para você ter uma ideia da gravidade, o meu pai teve que ajudar a me trocar e, então, fui para o hospital.
Fiquei uma semana em recuperação. Fiz uma ressonância magnética e o diagnóstico foi excesso de peso em aparelho de musculação. Depois de 15 dias, voltei para a academia, expliquei o ocorrido e pedi para mudar o treino. Eles mudaram alguns aparelhos, mas assim que comecei a melhorar, eles começaram a aumentar o peso novamente.
Automaticamente, depois de 15 dias, travei de novo e fui parar no hospital, mais uma vez. A partir daí, fiquei com medo de voltar a fazer fortalecimento, fiquei meio traumatizada. Até hoje, em relação ao joelho, não posso fazer nada mais intenso, que ele logo volta a inchar.
No carnaval de Salvador, no ano passado, por causa desse problema no joelho, não consegui fazer o circuito, óbvio. Já no segundo dia, eu tive que ficar pulando o carnaval em uma perna só. É claro que isso não foi muito longe e, depois de algumas horas, tive que voltar para o hotel e desistir do carnaval, tamanha era a dor no joelho.
A gente não imagina o quanto uma lesão como essa pode nos atrapalhar para o resto da vida.
Abaixo, confira o depoimento de Cathy Moor (65 anos). Cathy foi uma das primeiras mulheres a frequentar uma academia em São Paulo. Mais tarde, tornou-se uma das principais organizadoras dos eventos de aeróbica no Brasil. A sua história é enriquecedora e interessante.
Desde pequena, fiz muito esporte, joguei tênis, fiz atletismo, competi na escola, nos clubes, fui campeã paulista de natação. Desde muito nova, já aos dez anos de idade, eu era muito ativa. Aos 20 anos, como fazer atletismo não estava na moda, e meu pai não gostava muito, passei para a ginástica rítmica. Eu adorava essa modalidade. Passar para a ginástica aeróbica foi quase uma extensão da ginástica rítmica. Eu fui a primeira mulher a fazer academia em São Paulo, só tinha eu de mulher lá. Todo mundo falava: “Você é louca, vai ficar com músculos iguais aos de um homem.” Mas eu não queria ficar muito musculosa, eu apenas gostava de fazer musculação e aeróbica. Participei do início da academia no Brasil, foi a primeira academia que abriu na Avenida Henrique Schumann.
No começo da moda da aeróbica, eu passava um tempo enorme na academia. As aulas eram bastante intensas, eu pulava que nem uma cabrita, a gente pulava muito, eu adorava essa modalidade. Como, nessa época, eu já fazia eventos e falava bem inglês, tive a oportunidade de começar a trabalhar com eventos esportivos, que tinham tudo a ver comigo, com aquilo que eu gostava de fazer e com este ambiente das academias, onde eu já tinha muitos amigos.
Nessa época, começamos a trazer os europeus e norte-americanos para participar dos eventos de aeróbica que fazíamos. Nós nos tornamos os principais organizadores desses eventos no Brasil, que começou a se destacar na ginástica aeróbica com uma campeã mundial, a Patrícia Lobato. Nós organizamos um campeonato mundial de aeróbica aqui em São Paulo.
Hoje em dia, está muito diferente. Fui a uma feira de fitness, recentemente, e acho que existe um exagero, virou uma indústria muito voltada para o comércio e a venda de materiais. Vendem um monte de equipamentos e novidades. Tinha, por exemplo, uma mistura de pilates com kickboxing, entre outras modalidades bem engraçadas. Eu acho que existe muita coisa supérflua. Como alguém vai chegar lá e saber escolher entre tantos produtos e novidades? Tem um exagero de suplementos e outras fórmulas para emagrecer. Nós precisamos de pouca coisa em relação à suplementação. Quando vamos a uma boa nutricionista, ela só passa o básico, um pouco de proteína etc. Podemos consumir tudo isso de forma natural, através de uma boa alimentação.
Eu frequento a academia até hoje, vou com a minha filha. Mas hoje, já mais experiente, eu tenho outra visão do treinamento. Eu até a oriento para não pegar pesado e tomar mais cuidado.
Eu pulava que nem uma cabrita nas aulas de aeróbica, não dei muita atenção à prevenção e nem sei se me disseram alguma coisa relativa a isso na época. Eu apenas fui fazendo o treinamento de uma forma muito intensa.
Eu não tinha, mesmo, muita noção da consequência daquilo que fazia. Agora, estou com diversas lesões, tenho artrose no joelho e uma capsulite no ombro, porque eu fiz exercícios de musculação errados, sem uma devida orientação.
Nós vamos em uma academia sofisticada, onde se paga uma fortuna, mas muitas vezes nós ficamos sozinhas, sem uma boa orientação. Todo mundo puxa ferro, acha que é bacana, e pega cargas pesadas, mas tem que tomar cuidado. Eu estou com uma capsulite que me incomoda bastante. Quando o ombro sai do lugar, dói muito, mas agora eu já sei colocar ele no lugar. Já me disseram que eu teria de fazer uma cirurgia no ombro, mas eu não vou operar, nem por decreto. A recuperação demoraria dez meses. Uma cirurgia de ombro é muito delicada e sempre existe o risco de não ficar bom.
O que eu diria para quem está se exercitando nas academias, hoje, é que seria importante tomar muito cuidado no treinamento, alongar-se bem e sempre ter muita moderação naquilo que se faz. Esse negócio de pegar carga pesada e fazer tudo muito forte, então, nem pensar. A gente precisa aprender a respeitar o próprio corpo e nosso organismo. Respeitar o seu limite, ir devagar; e não chegar em uma esteira, olhar para o lado e começar a competir com a pessoa que está na outra esteira. Em vez de ficar se comparando com os outros e entrar nessa de fazer mais, nós precisamos aprender a encontrar a intensidade e o ritmo que sirvam para nós.
O importante é evoluir aos poucos, de forma gradativa. Outro dia, fui ao Ibirapuera e vi um velhinho correndo, ele devia ter uns 80 anos. Isso que é ser saudável! Pensar que podemos correr até uma idade bastante avançada. Mas, para isso, devemos ter muito cuidado com aquilo que fazemos.
A gente tem que comer bem, dormir bem, ter um grupo de amigos, isso é o mais importante. Quando a gente é jovem, não tem muito noção das coisas, a gente acha que pode tudo, a gente acha que nunca vai envelhecer.
“Advice for the young at heart, soon we will be older.” (Música da banda Tears For Fears, na tradução: “Conselho aos jovens de coração, logo seremos velhos”.)