CHAVE 21

Seria o mito da autoestima uma invenção que ajudou a fomentar o mercado da autoajuda?

Veja abaixo um trecho da matéria “As armadilhas da autoestima”, veiculada na revista Scientific American – Mente Cérebro, de Jennifer Crocker e Jessica J. Carnevale, professora e doutoranda de psicologia na Universidade do Estado de Ohio.

“Na década de 1980, nos Estados Unidos, alguns políticos, psicólogos e pesquisadores, em geral, se mostraram preocupados com a falta de autoconfiança da população.

O governo destinou milhões de dólares para uma força tarefa para promover a autoestima e a responsabilidade social, acreditando que o investimento influenciaria na queda da criminalidade, do fracasso escolar, do número de gestações indesejadas e da dependência química. Este movimento coincide com o início do boom de livros de autoajuda que pregam o poder da autorrealização, investindo no uso de “fórmulas” de motivação e felicidade.

No entanto, mesmo com o grande impulso do movimento a favor da autoestima – que não ficou restrito aos Estados Unidos, mas influenciou formas de pensar em todo o planeta –, dados científicos começaram a minar alguns dos seus principais pressupostos e sustentações. Muitas pesquisas mostram que pouca gente sofre disso. Pelo contrário, a grande maioria de nós já se sente muito bem sobre si mesmo.

Pesquisas recentes reforçam a constatação de que a autoestima não depende do sucesso em nossas realizações – que, em geral, garante apenas a sensação frágil e ilusória de bem-estar e poder. Porém, em excesso, a autoestima pode trazer sérias desvantagens. Além disso, a busca constante por reconhecimento é claramente nociva. Buscar obstinadamente alcançar sucesso em projetos que aumentam o próprio poder, sem que haja um objetivo maior além de simplesmente ‘vencer’, nos torna emocionalmente vulneráveis a angústias e frustrações, não raro, deflagra comportamentos prejudiciais ao desenvolvimento de competências e ao cultivo de relações pessoais saudáveis.

Na contramão do que costuma pregar a cultura vigente no mercado de trabalho, popularizado pela mídia e pela publicidade, o caminho mais eficaz para desenvolver e preservar a autovalorização é, ironicamente, pensar menos em si mesmo. Desenvolver compaixão pelos outros e por si próprio, de uma perspectiva menos egocêntrica, reforça a motivação em atingir metas pessoais, ajuda a lidar com as dificuldades e aprender com os próprios erros. De fato, hoje tendemos a nos supervalorizar. Estudos comprovam que, atualmente, os estudantes do ensino médio têm mais orgulho de si mesmos em comparação aos jovens da década de 1970. Curiosamente, isso não se traduz em mais desempenho ou equilíbrio emocional. Ao perceberem índices tão altos de autoestima, os pesquisadores começaram a relativizar a importância desse aspecto.

Em uma ampla revisão da literatura médica publicada em 2003, ficou comprovado que pessoas muito confiantes não se saem significativamente melhor no trabalho ou na vida acadêmica em relação àquelas com baixo apreço por si. A característica, igualmente, tem pouca relação com o grau de popularidade, qualidade das relações com as pessoas em geral, ou mesmo com a probabilidade de se tornar violento ou ter comportamentos de risco, como tabagismo e uso de drogas. No entanto, autoconfiança em excesso tem desvantagens. Talvez a mais imediata seja a dificuldade em perceber as próprias dificuldades e falhas. Pessoas com autoestima elevada tendem a ter opiniões positivas irreais sobre si mesmas. Quando recebem um retorno negativo, tendem a ficar defensivas e culpar a situação ou a pessoa que traz tal informação, ao invés de assumir os próprios erros e fragilidades, o que prejudica o aprendizado, o crescimento e as relações pessoais.”

(Fonte: Revista Scientific American – Mente Cérebro. Editora Segmento, n. 254.)

A “teoria do viés otimista” comprova esse fato. Assista ao vídeo a seguir, em que uma especialista apresenta com todos os detalhes esse assunto, em uma palestra no TED Talks de 2012: