O que podemos aprender com os cavalos
Aprendemos muito quando ensinamos, na verdade, acho que ensinar deveria ser mais uma tentativa de compartilhar experiências, do que um processo vertical de incutir conceitos pré-fabricados e estabelecidos como sendo uma verdade absoluta. Somos todos mestres e, ao mesmo tempo, aprendizes. Nos tornamos ignorantes quando adentramos em um mundo de outros saberes e expertises.
Tem sido muito gratificante exercitar o meu saber em pequenos grupos. Outro dia, um dos alunos desses grupos, o Fábio Bozelli, me contou uma história interessante. Ele pratica salto no hipismo, um esporte complexo e delicado, que exige uma percepção aguçada e sincronia com um animal sensível e extremamente empático. Quando sentamos em um cavalo, ele sincroniza os seus batimentos cardíacos aos nossos, em tempo real. Dessa forma, tudo aquilo que sentimos, por extensão, passa a ser sentido por ele.
O Fábio me disse que estava angustiado por sentir que a sua evolução no hipismo havia se estagnado. Sendo assim, ele resolveu compartilhar essa aflição com seu professor.
– Caramba, professor, há meses eu treino a mesma coisa e não consigo sair do lugar! O que está acontecendo?
– Ok, vamos tentar uma coisa… coloca o peso do corpo um pouco mais para trás, Isso! Agora, relaxa um pouco a tensão nos braços.
Depois de algumas dicas pontuais, o professor pediu para ele tentar novamente a manobra em que havia empacado. Para sua surpresa, ele conseguiu, finalmente, executá-la. As coordenadas passadas pelo professor já tinham sido passadas anteriormente, a diferença é que, dessa vez, ele parece ter conseguido relaxar e confiar na possibilidade de realizá-la.
Isso me remete a uma teoria interessante: sempre que tencionamos o processo de aprendizado, criamos uma dificuldade adicional e uma barreira à nossa evolução. Por enquanto, guarde essa teoria na memória, ela também servirá para explicar a dificuldade das pessoas em conseguir emagrecer. Quanto mais conflito e mais tensão, mais criamos barreiras à concretização dos nossos objetivos.
Por que ainda agimos como uma criança em relação àquilo que precisamos aprender? Por que nos tornamos tão dependentes de uma autoridade (o especialista, o professor), que irá nos pegar pela mão e nos conduzir em direção às nossas metas? Será que, na maioria das vezes, isso não depende mais de nós mesmos do que dos outros? O professor pode ajudar a mostrar o caminho, mas trilhá-lo cabe a você.
Após mais de 30 anos de experiência, trabalhando com alunos obesos, defendo uma linha comportamental de mudança de hábitos, tanto no corpo quanto na mente, de uma forma orgânica e gradativa. Muitas vezes, fico tenso quando o aluno me traz a sua angústia de não estar evoluindo, nessa hora, tenho duas opções: ou fico aflito com a sua reclamação, ou reconheço que essa angústia não me pertence.
Ao ceder a essa demanda, posso começar a pensar em soluções radicais e instantâneas para estancar essa angústia. Bom, se faço isso, acabo de cair na “vala comum” das soluções milagrosas e compactuo com a ansiedade e a pressa do aluno. Ou seja, a partir daí, ao invés de estar ajudando na solução, vou estar colaborando em manter e perpetuar esse problema.
Por que isso acontece? Porque a solução da questão está, exatamente, em aprender a sustentar essa angústia e, principalmente, na capacidade de olhá-la de frente, sem medo e sem possibilidade de fuga. Sempre que você fugir, você estará regredindo e voltando para trás, adiando a hora de encará-la e resolvê-la definitivamente.
Aqui, chegamos ao âmago da questão, a partir disso, podemos entender por que os métodos instantâneos e os gurus da autoajuda são tão populares. Eles te trazem uma falsa sensação de finalmente estar a caminho da cura ou da solução, colaboram em manter a sua dependência e a sua zona de conforto e, dessa forma, lhe proporcionam uma rota de fuga que te levará sempre para o mesmo lugar: para longe de você mesmo.
Acontece que a sociedade de consumo adora fugir. Sempre que você seguir uma receita generalista, esquemática e sedutora de busca da felicidade, controle mental, controle das emoções, emagrecimento, autoconhecimento, ou o que quer que seja, você estará se afastando da solução. Na vida, não existe atalho! Quem te vender um atalho estará, discretamente, te iludindo, pode ter certeza disso!
A solução sempre está dentro de você, não está fora. Querer adquiri-la nas prateleiras do “supermercado espiritual” da autoajuda mais atrapalha do que ajuda. Aliás, o título de um capítulo do meu livro é “Autoajuda que atrapalha” (Risos). Lá, eu destrincho, cuidadosamente, como funciona esse mecanismo.
Mas o que fazem aqueles que estão sempre fugindo de si mesmos? Eles estão sempre culpando e responsabilizando os outros pelo seu insucesso. Buscam sempre terceirizar a solução do seu problema. “Se esse professor não me fizer emagrecer, logo vou procurar um outro professor que o faça”, é o raciocínio mais comum. Dessa forma, o aluno se abstém da sua responsabilidade nesse processo.
É bom avisar que essa “peregrinação” corre o risco de não ter fim. As soluções superficiais, invariavelmente, nos fazem retornar para o mesmo lugar, uma vez que não estamos atacando a verdadeira causa dessa questão.
Veja, por exemplo, o caso do excesso de peso. Um dos principais fatores que sustentam esse processo é ter desenvolvido, ao longo dos anos, uma relação de tensão e angústia com a alimentação e com o seu corpo. Enquanto você não resolver essa relação angustiada e conflitante, internamente, tudo o que você fizer não irá fluir, assim como no exemplo do cavalo. Para entender esse assunto com mais profundidade, leia o artigo aqui no blog: “Fazer dieta engorda”.
Para uma perda de peso definitiva, o mais importante não é reduzir o peso corporal (essa receita você consegue em qualquer banca de revista), o mais importante é desconstruir os condicionamentos e a relação que o aluno tem com o seu corpo e com a comida. Para mudar o corpo, primeiro você precisa mudar a mente. Perda de peso rápida é igual a reganho de peso a médio e longo prazo, em 95% dos casos. Obviamente, o marketing dos produtos instantâneos irá te mostrar apenas aqueles 5% que conseguiram.
Aliás, o Fábio nos contou duas histórias complementares, na segunda parte da história, ele disse que, certo dia, estava injuriado com o cavalo e reclamou para o professor que o cavalo não conseguia fazer o que ele lhe mandava. O professor, inteligentemente, pediu para montar o seu cavalo e executou tudo o que ele estava tentando fazer, com imensa facilidade. Nesse ponto, ele percebeu que o problema era com ele, e não com o cavalo. Imagine que a nutricionista ou o treinador fazem as vezes do cavalo nessa fábula e você terá entendido essa questão.
É importante refletir: enquanto você não se responsabilizar pela sua felicidade e pela sua infelicidade, você continuará culpando os outros e o mundo por algo que cabe a você mesmo procurar resolver. Mudar é possível, mas exige paciência e coragem. Mãos à obra! Encare de frente os seus medos e os seus fantasmas. Ao fazer isso, você irá vê-los em seu tamanho real, não tão implacáveis e assustadores como você imaginava.