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31 out

Saúde, um bem em extinção

 

Se pudéssemos voltar apenas 100 anos em nossa história, os pilares essenciais que sustentam e estruturam a nossa saúde ainda estavam bastante preservados. Nesta época, as pessoas ainda caminhavam muito, em média de seis a oito quilômetros por dia (segundo algumas pesquisas), afinal, os veículos eram uma raridade. Atualmente, o excesso de conforto está destruindo o nosso sistema orgânico.

 

Você já experimentou fazer um pão em casa? Essa simples atividade de sovar representaria uma boa forma de fortalecimento, principalmente para o tríceps e peitoral. E, antigamente, as pessoas realizavam não só essa, mas diversas outras atividades. Muitas tinham uma pequena horta, onde cuidavam mais da própria terra, subiam escadas, usavam pilão para fazer farinha, lavavam roupa na mão, entre outras atividades que as deixavam naturalmente mais ativas. O mundo contemporâneo trouxe inovação e comodismo.

 

A partir da década de 1950, com a invenção norte-americana dos eletrodomésticos e do universo do consumo globalizado em escala, acrescido da facilidade oferecida pelas escadas rolantes, elevadores e popularização dos carros, ficou mais fácil ser sedentário. E, a princípio, não vimos problema nenhum nessas tais “facilidades”.

 

Qual a nossa realidade hoje? Um indivíduo acorda de manhã, depois de passar oito horas deitado, e se senta para tomar seu café da manhã. Em seguida, ele desce de elevador até a garagem de seu prédio e senta-se em seu carro para se dirigir ao trabalho. No final da manhã, após ficar outras cinco horas sentado trabalhando, ele vai de carro até um shopping, sobe algumas escadas rolantes ou elevador e fica novamente mais alguns minutos sentado para o almoço. Após passar o dia grudado numa cadeira, em frente ao computador, ele chega em casa e senta-se para o jantar.

 

Depois de tudo isso, como ele está muito cansado (afinal, ele ficou sentado o dia inteiro!), finalmente, liga a TV e fica mais algumas horas nessa mesmíssima posição. Por que será que ele tem uma hérnia de disco ou está com diabetes, pressão alta, depressão e apresenta diversos desequilíbrios orgânicos? A resposta é que não nascemos para viver sentados. Já em relação à alimentação, há 100 anos, havia pouquíssimos alimentos industrializados e as pessoas consumiam basicamente alimentos naturais e orgânicos, plantados a poucos metros da sua casa. Faziam compras na mercearia e faziam pães, bolachas, sucos e outros alimentos em casa. Ainda não existiam os grandes supermercados e seus milhares de produtos altamente artificiais e sedutores.

 

A indústria dos alimentos ainda engatinhava e o fast-food nem dava sinais de vida. Apesar de consumir alguns alimentos pesados, como a banha de porco, as pessoas almoçavam e jantavam em casa, pois a maioria delas morava próximo do trabalho. Se não moravam, carregavam consigo uma marmita caseira, como opção lógica de refeição para o almoço. Em relação ao sono, elas iam se deitar por volta das oito ou nove horas da noite, já que não existia televisão ou o conceito moderno de vida noturna. Elas iam se deitar com as galinhas e dormiam em paz, com silêncio e tranquilidade, visto que não havia muitas atividades nas ruas.

 

Como podemos perceber, a nossa “Santíssima Trindade”, os pilares essenciais à nossa saúde – sono, alimentação e movimento –, ainda estavam bastante preservados.

 

 

 

O foco no resultado pode conduzir a um péssimo resultado para o seu corpo

 

Hoje, com o conceito de gestão de empresas focado em metas e cobranças de resultados, certificados, controles, bônus e toda forma de se espremer ao máximo os funcionários, tudo isso mudou. Esse sistema de gestão alimenta a insônia no mundo. Com o foco apenas na performance e no resultado, torna-se uma praga que “buga” o sistema orgânico e o deixa cada dia pior. Sim. O mundo está insone e sem tempo. As pessoas não têm tempo e nem energia para fazer uma simples caminhada. Elas comem fast-food, bebem refrigerante, consomem alimentos saturados, químicos e industrializados de uma forma indiscriminada. O mundo sofre de uma crise crônica de ansiedade, e, sendo assim, come de forma apressada, sem nem pensar no que está comendo, pois está preso ao celular.

 

O mundo está doente, obeso, flácido, sem energia e sem tônus, pois se movimenta cada vez menos. O mundo toma remédios, pois tomar remédios é a opção mais rápida e mais prática para continuar sobrevivendo. Resumindo, é isso: nós não estamos mais vivendo, nós estamos apenas sobrevivendo. Vejo isso diariamente em meu trabalho, em que me encontro com grupos heterogêneos, que, de certa forma, são até homogêneos, já que quase todos dormem mal, são sedentários, estão ansiosos, depressivos e sem energia, entre dezenas de outros desequilíbrios.

 

Outro dia, num dos grupos que atendo, chegou um rapaz com uma história curiosa e, infelizmente, bastante comum. Aos 28 anos, ele já tinha quase todos os cabelos brancos, não dormia, não se movimentava e comia muito mal. Além disso, sofria de ansiedade e depressão. Trabalhando com tecnologia da informação, ficava no computador até às duas ou três horas da manhã, pois tinha que levar trabalho para casa, para dar conta dos prazos e metas que lhe eram impostos. No outro dia, acordava às sete horas da manhã e começava tudo de novo. Que sistema de vida é esse que inventamos? Ele, claramente, não estava vivendo, estava apenas, male e male, sobrevivendo. Aos trancos e barrancos, da forma como lhe era possível.

 

Li, recentemente, que a ansiedade já é o terceiro motivo de afastamento do trabalho, no Brasil, custando 200 milhões de reais aos cofres públicos anualmente, e que o auxílio doença para transtornos mentais e emocionais aumentaram (pasmem!) 20 vezes nos últimos dez anos. (Fonte: Elemídia) Nos EUA, os gastos com a diabetes no ano passado, em 2022, foram de mais de 350 milhões de dólares (por que será que esses índices aumentam ano a ano, no Brasil e no mundo? Para saber a resposta, veja o texto anterior aqui no blog: O desmatamento espiritual).

 

Mas, será que as pessoas sabem que a nossa performance cai 50% quando dormimos mal? Será que as empresas sabem disso? Será que elas sabem que, agindo da forma como estão agindo, estão matando a criatividade e a produtividade do seu funcionário? E eu me pergunto: até quando faremos tudo dessa maneira? É esse mundo que queremos para os nossos filhos?

 

Quando você vai acordar desse pesadelo? Ou você está achando normal ver tanta gente doente, desequilibrada, esgotada, estressada e deprimida? Quando vai acordar para o fato de que sem o seu corpo, sem a sua saúde você é alguém pela metade? Que você é apenas um ser insone que sobrevive, longe da sua verdadeira capacidade, vitalidade e potência? Dormir mal, por si só, inviabiliza qualquer visão positiva da vida.

 

O que acontece quando uma pessoa procura um médico? Em primeiro lugar, é provável que esse profissional vá receitar alguns remédios. O combo é grande – temos remédio para dormir, para ficar menos ansioso, para tratar a depressão, para estabilizar a pressão arterial, para o colesterol e até para manter a pessoa acordada.

 

A pergunta é: você acha que isso vai realmente resolver o problema ou apenas adiá-lo? Qual seria a forma de curar esse paciente de uma maneira definitiva? A resposta é: devemos atacar a verdadeira causa do problema. E essa causa, na imensa maioria das vezes, está ligada aos desequilíbrios encontrados na “Santíssima Trindade” do corpo, que são sono, alimentação e movimento equilibrado. “Poxa, Nuno, mas se é tão simples assim, porque não fazemos nada a respeito?”, você deve estar se perguntando. A resposta, para se aproximar da realidade, tem de ser mais abrangente. Podemos enumerar alguns fatores:

 

• Estamos aprisionados aos nossos hábitos adquiridos

• Este não tem sido um foco importante em nossas vidas

• Culturalmente, vivemos um ideal fantasioso de sucesso e felicidade

• A maioria das empresas não pensam no longo prazo

• Fazer atividade física equivale a uma forma de tortura

• A prevenção não dá ibope

• O lobby da indústria dos medicamentos é poderoso. E muitos outros fatores…

 

Como você pode ver, são vários os motivos. Dizem que nosso método é mágico, mas eu vou lhe contar um segredo: na realidade, não existe segredo algum, nós apenas ajudamos as pessoas a saírem dessas prisões comportamentais em que elas mesmas se inseriram. Mágica é a própria natureza. Mágica é a vida!

 

 

 

Coffeeholic

 

Em uma sociedade que glamouriza a performance, somos convencidos de que extrair o máximo de nós mesmos é uma autoimposição desejável, sendo levados a acreditar que o sucesso seria resultado de um sacrifício. Todos podem ter sucesso, caso sigam sua mente positiva e poderosa. É o que nos dizem. Mas, e o corpo? O que fazemos com o corpo? Esse limitador da performance, esse empecilho. A fórmula é simples: doses cavalares de cafeína e energéticos acrescidos de juventude, mais cinco colheres de força de vontade, dão conta do recado. Mesmo que à custa de um cansaço crônico, esgotamento nervoso, pânico e depressão.

 

Nesse contexto, os ansiolíticos, antidepressivos e toda forma de anestesiar a consciência são bem-vindos. Haja Rivotril! Aliás, por mais absurdo que possa parecer, o Brasil é o maior consumidor do mundo, em volume, de clonazepam, o princípio ativo do remédio. Foram 2,1 toneladas em 2010, o que coloca o Rivotril no topo das paradas farmacêuticas daqui. É o segundo remédio mais vendido no país, à frente de nomes como Hipoglós e Buscopan. (Fonte: Revista Superinteressante, ed. 280).

 

Como a competitividade é algo que se acentua e se refina, nos tornamos escravos de uma engrenagem perversa. A competição é algo que pode ficar fora de controle. Um bom exemplo é a Coreia do Sul. Pesquise no Google: “Coreia do Sul: A República do suicídio”. Nesse país, aos poucos, criou-se um grande mercado de ensino preparatório para a faculdade. Alguns pais direcionam quase todo o fruto de seu trabalho para cursos preparatórios de modo a propiciar ao filho chances nas melhores faculdades. Com o tempo, o ensino foi se tornando mais exigente, sofisticado e subindo o sarrafo da competitividade. O resultado foi que isso se tornou uma espécie de corrida armamentista. Ou seja, quando o seu concorrente desenvolve armas mais eficientes, isso o força a criar armas ainda melhores. Neste processo, entrar em uma boa faculdade passou a exigir, em média, quinze horas de estudo diário, incluindo os finais de semana.

 

Nesse nível estratosférico de dedicação, muitos alunos ficam pelo caminho, enlouquecem ou chegam ao cúmulo de cometer suicídio. Hoje, ao invés do sonho de economistas como Adam Smith, que previam um cenário em que, no século 21 as pessoas trabalhariam muito menos e seriam mais felizes, o que assistimos é exatamente o contrário.

 

A lógica e o ritmo alucinante do mercado de trabalho atropelam tudo. Agora, onde eram necessárias duas pessoas para dar conta do recado, colocam apenas uma. O pior é que, se você não quiser a vaga, a fila de pretendentes é enorme. A grande verdade é que estamos sempre ativos e trabalhando, seja estudando nas horas vagas para nos mantermos atualizados e competitivos, seja levando trabalho para casa. Com o computador, a nossa própria casa virou uma extensão do trabalho. Todos já estão bem treinados. Explorar a si mesmo e trabalhar além do limite humano tornou-se uma condição inerente para quem almeja sucesso e felicidade. É o que nos dizem.

 

Não é necessário o uso de muito convencimento para submeter e escravizar. O recurso é mais sutil. O que se vende é o auto sacrifício como uma virtude. Em uma sociedade de super-homens, super empresários e atletas de alta performance, não fazer parte disso é assumir-se um fraco, a quem falta disciplina e força de vontade. E aí valem as soluções mais criativas. Um amigo, por exemplo, não tem tempo nem de ir ao banheiro. Devido a esse péssimo hábito, ele sofre de uma prisão de ventre crônica. E adivinhem qual solução ele encontrou? Se engana quem respondeu respirar, fazer meditação e trabalhar menos.

 

Para ele, isso seria uma mera perda de tempo. Então, ele resolveu colocar um notebook sobre uma mesa retrátil em frente ao vaso sanitário. E, hoje, ele se gaba de poder fazer suas necessidades enquanto aproveita para adiantar o trabalho. Quem diria, até esse último santuário está ameaçado. O quarto de dormir já foi invadido por TVs e smartphones há muito tempo. Já era!

 

Outro aluno, para deixar a vida mais prática e acelerar o ritmo do dia, e assim, teoricamente ganhar mais produtividade, passou a substituir o café da manhã e o jantar por shakes e suplementos sintetizados, fazendo apenas um lanche rápido na hora do almoço na própria mesa de trabalho, engolindo tudo em 5 minutos.

 

Nesse mundo 24 horas, em que as pessoas nunca se desligam, o trabalho invade até os nossos sonhos.

 


 

Ps: Reproduzo aqui os primeiros capítulos do meu livro: “O músculo da alma, a chave para a sabedoria corporal. Para acessar gratuitamente as 50 primeiras páginas, clique aqui.