Blog

11 mar

A Verdade “Definitiva”

Resolvi esclarecer aqui um grande mito do treinamento físico.

Como bem sabemos, o mundo está em constante transformação.

Nada é definitivo. Como diz o ditado popular: a verdade existe e cada um tem a sua. Tudo é uma questão de ponto de vista.

Todos os métodos de treinamento têm vantagens e desvantagens. Porém, quanto mais radical for um método mais efeitos colaterais ele pode provocar.

O título dessa matéria brinca com uma questão bastante séria. O marketing é a arte da sedução, ele mexe com nossos desejos mais profundos e os manipula.

Quando alguma nova moda de treinamento surge na mídia prometendo resultados efetivos e se vestindo de solução para o emagrecimento, o que está embutido de forma subliminar nessa mensagem é que, de certa forma, esta seria a “solução definitiva” para a questão. Com este truque de marketing, todo o mercado passa a consumir essa “novidade” e assim, alguém fatura milhões com copyright desse produto. Nesse sistema, fica implícito que todas as outras propostas estariam ultrapassadas. Será que isso é verdade?

Pois é, em relação a saúde as pessoas estão sempre a espera de um milagre, elas não querem resolver os seus problemas, de forma concreta, elas querem que alguém os resolva por elas. Com esta deixa, entra o mercado de consumo e lança fórmulas instantâneas e sedutoras para, supostamente, atingir tal objetivo.

É impressionante a capacidade do ser humano em ser crédulo e alimentar a esperança. A esperança é a última que morre, não é?

Se as últimas dez dietas da moda que você fez não funcionaram de forma definitiva, por que uma nova dieta iria funcionar? Se as últimas dez tentativas de seguir os treinamento da moda não funcionaram, por que esta última novidade deveria trazer resultados efetivos e duradouros?

Já lhe ocorreu que as dietas da moda e os treinamentos da moda seguem um mesmo princípio? Eles estimulam e levam os alunos a seguirem uma receita que está fadada ao insucesso, para a grande maioria da população, por meio de fórmulas radicais de dieta e treinamento. O equilíbrio está no meio, não está nos extremos.

As modas do treinamento são criadas nos EUA e exportadas para todo o mundo. Elas são escolhidas a dedo, quanto mais apelativas e radicais mais sucesso fazem. O que se vende é uma promessa que não é possível entregar. O nosso corpo não é uma empresa, em que quanto mais rápido for o prazo de execução de uma meta, melhor. Ao contrário, no treinamento quanto mais pensamos a médio e longo prazo melhor será o resultado final.

O caminho mais curto torna-se o caminho mais demorado, tudo que vem rápido vai embora rápido. A lista de efeitos colaterais desse modelo do “sem dor, sem ganho” é enorme. Para saber mais leia aqui em meu blog o artigo: Pesquisas contraditórias, afinal, em quem acreditar?

Pois bem, o que vou dizer agora irá desfazer um engano que ilude e manipula os alunos há muitas décadas: já está mais do que provado que a atividade física, de forma isolada, não é um fator determinante no emagrecimento. O que isso quer dizer? Quer dizer que você pode fazer a atividade mais radical e intensa que houver e mesmo assim, caso não altere seus hábitos alimentares, a redução do peso não será efetiva a médio e longo prazo. Isso significa que a atividade física não é importante no emagrecimento? Não, ela é essencial nesse processo, agindo no controle da ansiedade e no metabolismo e auxiliando tanto na redução como na manutenção do peso corporal. Porém, é um engano vender uma forma específica de atividade física como uma solução milagrosa para o emagrecimento. Isso não existe. O mais importante na atividade física não é tanto “o que” você faz, mas “o como” você faz. Existem centenas de atividades que colaboram na perda de peso.

Na realidade, essa questão é bem mais complexa. Pessoas que treinam com o foco intenso no emagrecimento tendem a desistir do treinamento, constantemente. Elas costumam adotar estratégias radicais e modelos não sustentáveis de treinamento. O salto mais essencial para a população é desenvolver uma relação de prazer com a atividade corporal. Como isso seria possível através de um modelo de treinamento baseado na dor e no sofrimento?

Em qual ponto eu quero chegar? Quero argumentar que você pode estar sendo vítima de uma ilusão. O modelo atual da alta intensidade não faz nenhum sentido quando aplicado à realidade de mais de 90% da população (somando-se os sedentários, obesos, alunos com sobrepeso, idosos, alunos sem regularidade e alunos sem adaptação a esse modelo radical). Para a maioria da população ele só funciona como uma hipótese ideal. Uma simples caminhada pode ser mais eficiente que qualquer uma dessas modas radicais. Você duvida? A eficiência de que falo aqui é um pouco mais sofisticada, não está relacionada apenas ao número de calorias gastas e ao condicionamento físico e deve ser medida pelo custo-benefício dessa atividade. Devemos também analisar o quanto esta atividade é sustentável e inclusiva, ou seja, o quanto ela colabora para a adesão do aluno.

O conceito de intensidade no treinamento varia de aluno para aluno. Por exemplo, para alguém que esta 30 kg acima do peso e inativo há muitos anos, uma caminhada de 60 minutos em ritmo acelerado pode elevar seu batimento cardíaco a 140 bpm ou mais, representando um grande stress ao organismo,  podendo fazer as vezes de um treinamento mais intenso e vigoroso. Para muitas pessoas a frequência cardíaca máxima é atingida apenas caminhando rápido em uma subida. Desta forma, constatamos que o nível de adaptação ao esforço da média da população é uma realidade cruel, muito longe dos modelos ideais de treinamento. Quando este perfil de aluno é exposto a um modelo de treinamento muito intenso e exaustivo, a resposta fisiológica pode ser uma letargia, fadiga crônica ou um quadro grave de overtraining podendo levar a uma depressão, caso o aluno insista nesse modelo (a maioria desiste antes disso). Ou seja, ao final do processo ele vai estar pior do que quando começou. Fora o extremo risco de lesões decorrente do modelo da alta intensidade, nesse caso especifico.

Segundo o relatório anual da IHRSA, associação que reúne as academias em todo o mundo, a taxa de desistência nas academias é alta, girando em torno de 50% após três meses. Vamos encarar a realidade, alguém precisa dizer a verdade. O modelo do “sem dor, sem ganho” tem se mostrado extremamente ineficiente, e exclui uma enorme parcela da população. É necessário repensar o conceito de eficiência no treinamento.  Para entender melhor a abrangência e complexidade desse assunto, leia meu livro “O Músculo da Alma – A chave para a sabedoria corporal”

Sabe aquela propaganda dizendo que tal atividade leva seu corpo ao limite e queima oitocentas calorias? Pois é, para a grande maioria da população, isso deve servir como um indicativo de que tal atividade deve ser evitada. Estes exercícios são recomendadas para quem está em um estágio avançado, servem apenas para uma elite do treinamento. Na realidade, eles representam um grande perigo à sua saúde e integridade corporal.

O melhor exercício não é aquele que queima mais calorias, mas aquele que você gosta de fazer. Esse sim, vai dar resultado.

Para ser efetiva a atividade física deve ser incorporada a uma rotina, esse é o grande segredo. Caso esta atividade seja prazerosa, lúdica e equilibrada, o desafio será muito mais acessível e convidativo para uma grande parcela da população.